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Memorias do Alto do Rodrigues


ALTO DO RODRIGUES
O GAROTO DO VALE

Artigo de Gilberto Freire de Melo, publicado em 1987, em Plaquete de Pe. José Luiz, intitulada ALTO DO RODRIGUES - A ARRANCADA PARA O PROGRESSO.

                Alto do Rodrigues é o mais novo município do Vale do Açu. Promovido à categoria numa época em que já se podiam divisar os novos rumos do futuro, face à revolução do transistor e à chegada do iê-iê-iê, rebentou como um jovem nos embalos de outros horizontes e com visões para uma nova época que já se delineava.
                A transformação em nova, de uma mentalidade já existente, não foi tão fácil como a implantação. O que justifica a formação mental do novo Alto do Rodrigues é o fato de, ao adquirir a liberdade de caminhar com os próprios pés, entrar no prisma das grandes mudanças sem os obstáculos convencionais. A implantação de sua nova mentalidade não sofreu as restrições impostas às diversas fases de transformação.
                Os educadores que iniciaram essa implantação nunca se apegaram a preconceitos e nunca tiveram medo da convivência com as inovações despejadas no mundo pelos métodos modernos de comunicação que anunciavam a pressa das transformações.
GILBERTO FREIRE DE MELO
                Daí, podermos informar que Alto do Rodrigues, tendo todas as características regionais do Vale do Açu, não sofreu traumas com a mudança global que se verificou em ritmo de iê- iê- iê, nem se afastou das raízes que nos predem umbilicalmente à Várzea do Açu. E, mantendo essa intimidade com a evolução e, às vezes adversas, conseqüências da explosão petrolífera.
                Sua administração atual, nas mãos de Abelardo Rodrigues Filho, dispõe de um generoso poder orçamentário que lhe proporciona uma verdadeira arrancada progressista. Haja vista a distribuição de uma receita destinada especialmente aos setores de educação, saúde, obras e rodovias, nos quais aplica mais de três quartos do total.
                A Várzea do Açu tem Alto do Rodrigues como o seu filho mais jovem que, mais afoito, disputa, de braços dados e em igualdade de condições, com os mais adultos, os espaços mais difíceis da convivência com o desenvolvimento.
                Em Alto do Rodrigues se vive a Aldeia Global. As perfuratrizes, os oleodutos e os jumentos caminham no mesmo sentido. E assim, o Garoto do Vale salta para o progresso, carregando consigo as imagens dos TABATINGUEIROS, os primeiros exportadores de hortaliça da região, que levavam, na cabeça, os balaios de cebola e de coentro que mais pareciam coroas imensas a glorificarem a coragem, o trabalho, a obstinação de um povo.

O TABATINGUEIRO
Artigo de Gilberto Freire de Melo, publicado em jornal periódico de Açu-RN, em meados de 1997.

                Hoje localizado em área desmenbrada do município de Pendências, que passou a constituir Alto do Rodrigues, o TABATINGUEIRO é o habitante da comunidade de Tabatinga, assim chamada em virtude de ser o seu solo esbranquiçado, confundindo-se com o calcário e com o caolim, minérios  comumente encontrados na região. Com hábitos, costumes, caracteres e formação comuns às demais comunidades do Vale do Açu e das adjacências, seus habitantes se destacaram por demonstrar maiores aptidões para o trabalho e ter mais aguçada a visão comercial.
                Enquanto a exploração agrícola da região se limitava às culturas rudimentares de subsistência necessárias aos padrões de alimentação próprios do roceiro do nordeste brasileiro, o TABATINGUEIRO, embora e também sem condições culturais para uso de outras iguarias em sua mesa, pressentiu a necessidade da população da vizinha cidade de Macau, que, por ser litorânea e de hábitos mais voltados para o consumo dos produtos pesqueiros, sem possibilidade do cultivo de suas terras salinizadas pelos efeitos marinhos, adquiria, de além fronteiras, os temperos cheirosos indispensáveis aos preparo do peixe que utilizava.
                Assim, além de cultivar o necessário para sua alimentação, o TABATINGUEIRO cultivava, em abundância, o coentro, a cebolinha - o cheiro verde - para venda na cidade de Macau, onde a comercialização era garantida. E bandos deles transportavam, a pé, sobre cabeça, imensos balaios - utensílios avantajados feitos do talo da carnaúba - que enchiam com sua mercadoria, cobrindo com envoltórios de tecido de algodão, numa maratona de 30 quilômetros, num chouto largo, cadenciado, quase correndo, até o mercado consumidor de seu produto. E, equilibrado sobre suas cabeças, esses balaios mais pareciam imensas coroas a glorificarem a sua coragem, o seu trabalho, a sua arte, a sua obstinação.



OS CAMINHOS DO ALTO
Artigo de Padre José Luiz, publicado em plaquete, datada de 1987

                São quase 10.000 habitantes, incluindo a população flutuante. Mais de 4.000 eleitores. Nas últimas eleições votaram 3.663.
                A cidade é banhada pelo rio Açu. Além do rio há uma lagoa ao leste da cidade, chamada Lagoa de Pedras.
                Assim descrito, Alto do Rodrigues se reduziria a números e referências geográficas. Mas o Alto tem uma história muito rica para contar. Seu povo simples possui sempre um espírito libertário muito definido. Na década de 50, os sindicatos dos marítimos e dos salineiros exerciam aqui uma influência muito grande.
                Até aqui, nada foi escrito sobre esse período. Tudo é sabido por transmissão oral. Precisa-se conversar com João Galo ou Antônio Zacarias para se ter uma idéia do grau de politização do Alto do Rodrigues de então. Sem estradas ou telefones, os meios de comunicação eram os mistos de Abelardo e de Deoclécio. Mesmo assim, se conseguia sonhar.
                Na década de 60, o centro polarizador de Alto do Rodrigues era a paróquia. Organizavam-se cursos de líderes, promoviam-se debates.
                A capela era visitada como se fosse um centro de atração turística. Dona Rosa, Dona Sinhá Rodrigues, Iracilde e Maria Natália entendiam, como os jovens, as transformações da Igreja, advindas através do Concílio.

Imagem - foto

Pe. José Luiz, que em seu ministério, priorizava humanizar para depois evangelizar.

                Mais tarde, 1963, veio o Município. E com ele, novo tipo de pioneirismo, dessa vez ligada à educação, com a decorrente fundação do Ginásio, liderada por David Faheina.
                Mais tarde, chegaram os poços de Petróleo e rostos desconhecidos começaram a povoar a cidade.
                A palhoça de Donzela foi transformada em restaurante. Os mistos agora centenas e centenas de carretas conduzindo riqueza.
                Depois do petróleo que será conduzido pelos oleodutos, o Alto do Rodrigues se prepara para modernizar sua agricultura. É a volta às raízes, agora feita com irrigação. São quase mil hectares na primeira etapa. O Vale do Açu produzindo, começa pelo Alto.
                O entusiasmo dos tempos da CODEVA, agora passa pela AMVALE, responsável pela consciência regional que está se implantando no Vale do Açu.
                Os meninos de ontem, agora são os prefeitos, os vereadores, os professores do Vale. E o Alto, consciente dessa retomada, atrelou-se ao trabalho. Procurou qualificar-se. No Alto do Rodrigues, a competição política não desintegrou o espírito comunitário do seu povo. Nem uma influência estranha impediu que todos se tratassem com respeito. Desde o início, o Alto do Rodrigues se caracterizou pela cordialidade. Paulo Damas ou Giovani, políticos de ontem e de hoje, sabem que o essencial é que o Alto não esteja em baixa. É como aquela frase do Juvenal Galego em relação ao Ceará:
                - "Pelo Brasil eu morro, pelo Ceará eu mato".

CORAÇÕES AO ALTO !
Artigo de Pe. JAIME Vieira Rocha (1987), à época vigário de Pendências e de Alto do Rodrigues, atual bispo de Campina Grande-PB.

                "Corações ao Alto" é uma expressão do celebrante durante a missa à qual o povo responde: "O nosso coração está em DEUS".
                A palavra CORAÇÃO é citada 155 vezes na Bíblia e é sempre empregada pelos autores sagrados para significar o "Eu do Homem, o seu interior que DEUS vê, a sua mente, a sua personalidade que está escondida". Os planos e a vontade estão no coração. Jesus Cristo nos diz no seu evangelho: "onde está o teu tesouro aí estará também o teu coração". (Mt. 6, 21). Também está na palavra de DEUS: "Pensai nas coisas do Alto..." O Alto para o homem é DEUS, é o infinito, é a força que nos eleva para valores que nos dão mais vida.
                Lembro-me da primeira imagem do Alto do Rodrigues, quando cheguei por aqui há doze anos. Hoje, tudo mudado. Crescimento rápido, progresso, movimento, dinheiro, festa, bares, hotéis, restaurantes, trabalho, empregos, e tudo mais que é o produto do progresso.
                Sinto-me honrado em ter acompanhado de perto a transformação do Alto do Rodrigues. E mais honrado ainda em ver seu povo mobilizado para construir o seu futuro.
                Era a Juventude Agrária Católica (JAC); os grupos 4, da então ANCAR;era a atuação do Centro Social. Tudo isso animado e vivido pelas pessoas que ainda hoje permanecem vivas na mente da geração atual, ou que ainda contribuem com a sua presença e a sua participação em tudo aquilo que é busca para a cidade que agora é outra, sem esquecer o seu passado, a sua história.
                É justamente a partir desse fato - reconstrução da Igreja - que a cidade se reencontra com o seu passado e com sua história.
                História marcada pela vida simples de comunidade, espaço onde as pessoas se dedicavam pelo espírito de idealismo, de participação, e de valores cristãos a fazer algo pela vida da cidade, a vida que é vida resultante dos trabalhos comunitários, dos grupos que se iam formando conforme as exigências da época.
                Eu acredito no Alto do Rodrigues porque o que foi plantado aqui, foi plantado com espírito missionário.
                O trabalho de Pe. Zeluiz, hoje jornalista José Luiz, deixou marcas de pioneirismo na comunidade. Numa época quando tudo era difícil e distante, ele reunia e mobilizava o povo, mostrando-lhe os caminhos do futuro. E o futuro chegou.
                O que me alegra é que este futuro não chegou esmagando o passado. Não chegou desacompanhado da fé. Os meninos daquele tempo hoje são políticos, comerciantes, administradores. As meninas que organizavam o Pastoril, para comprar um centro gerador para iluminar o povoado, hoje são mães de família, educando seus filhos para um mundo mais exigente.
                Quantos recordam esse tempo com alegria e a felicidade de sabê-lo heróico!
                Corações ao Alto! É o povo feliz alimentando seus filhos. Corações ao Alto! É DEUS abençoando o seu povo.

                ASSIM SE MANIFESTARAM SOBRE ALTO DO RODRIGUES, SUA FUNDAÇÃO E SUAS PERSPECTIVAS, OS CRONISTAS DA REGIÃO. VEJAMOS, AGORA, COMO SE VÊM CONSOLIDANDO ESSAS PERSPECTIVAS, QUANDO O FUTURO ANUNCIADO JÁ É COISA DO PASSADO.


ORIGEM E FORMAÇÃO DO MUNICÍPIO
Maria Libânia Carlos de Lemos
Ambientalista alto-do-rodrigues


                Descendente o português Manoel Rodrigues Ferreira e da brasileira norte-rio-grandense Isabel Rodrigues Ferreira, Joaquim Rodrigues Ferreira nasceu na fazenda Boa Vista, atual município de Pendências, a 26 de outubro de 1827. Casou-se inicialmente com Generosa Rodrigues da Silveira, e depois de enviuvar, casou, pela segunda vez, em 21 de outubro de 1873, com Ricardina Rodrigues Cavalcanti, contando, dos dois casamentos, 22 filhos, dentre os quais os nossos conhecidos:
·         Álvaro Rodrigues Ferreira
·         Francisco Rodrigues Ferreira
·         Rosa Rodrigues Ferreira

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Libânia Carlos de Lemos, ambientalista alto-do-rodriguense.

                Além de agropecuarista na Fazenda que passou a se chamar Alto do Rodrigues, por ser situada na parte mais elevada da região, onde passou a residir, Joaquim Rodrigues Ferreira filiado ao Partido Republicano, após a queda do império, aliado a Pedro
                Velho de Albuquerque Maranhão, Miguel Joaquim de Almeida Castro e Amintas Barros, foi um dos chefes políticos de Macau. Aí além de representar o Partido Republicano, na região, ingressou na Guarda Nacional, como coronel, foi administrador da Mesa de Rendas Estaduais de Macau e suplente de Juiz Distrital no termo de Angicos, não assumindo por não haver recebido a tempo o título de nomeação.
                Durante os derradeiros anos do regime imperial, nas últimas décadas do século XIX, o coronel Joaquim Rodrigues Ferreira era um dos chefes políticos de Macau e sua área de atuação se estendia até Açu. Possuía uma fazenda de gado à margem direita do rio Açu, onde invernava na casa grande que construiu sobre a elevação mais saliente de que se originou a denominação Alto do Rodrigues, tudo isso após a desumana expulsão dos índios pataxós, seus primeiros habitantes que já se haviam transferido para o alto do sertão.
                Sua atuação mais destacada foi o comércio que passou a explorar, comprando e vendendo produtos agrícolas como cera de carnaúba, algodão, gado, instalando-se, posteriormente, com lojas de tecidos, de cereais e gêneros destinados à manutenção dos habitantes que já se aglomeravam com núcleos residenciais nas proximidades.
               
                Nos últimos anos de vida, Joaquim Rodrigues já chefiava numerosa família, morreu aos 77 anos de idade, em 23 de março de 1904.
                Dois de seus filhos se destacaram na localidade: Álvaro Rodrigues explorando ações comerciais e Francisco Rodrigues mais inclinado para atividades políticas e, juntos, perpetuaram o nome da família, contribuindo e influenciando as ações econômicas e políticas, fazendo prevalecer a denominação original da povoação, que permaneceu mesmo quando elevada à categoria de município.
                Em 1942, era um dos centros demográficos de Pendências, e, em 1950 já se viam aglomerados de casas esparsas, em que eram estalados os lavradores de algodão, operários da indústria da cera de carnaúba e da agropecuária.
                Criada a autonomia político-administrativa pela Lei 2.859, de 28 de março de 1963, no governo de Aloísio Alves, já caminhando com os próprios pés, Alto do Rodrigues passou a pensar em emancipação para, unidas, construírem o seu território com vistas ao futuro que se aproximava. Inicialmente, para instalação do município, foi nomeado o primeiro Prefeito Luiz Moreira da Silva, que abriu as portas administrativas e políticas para implantação da vida constitucional.
                O município se implantou então com uma área de 6.498 habitantes, perfazendo uma densidade populacional de 31 habitantes por km2, numa área de 207,4 quilômetros quadrados. Equivalente a 0,39% da superfície estadual. Em relação à divisão territorial do Brasil está localizado na Meso-região Oeste Potiguar, inserido na Micro-região do Vale do Açu. Localiza-se em uma altura média de 13 metros acima do nível do mar, em uma posição geográfica determinada pelos paralelos 05, 17, 18 graus de latitude Sul e pelo meridiano 36, 45 graus de longitude Oeste. A distância em relação à capital é de 210 km. Limita-se ao Norte, com o município de Pendências; ao Sul e Leste com o município de Afonso Bezerra; e ao Oeste com o rio Açu e município de Carnaubais.
                O município de Alto do Rodrigues é composto das seguintes comunidades: Alto Alegre, Baixo Açu, Barrocas, Boca de Várzea, Canafístula, Canto do Roçado, Fazenda Gangorra Listrada, Mestre Severino, Ponciana, Estreito, Tabatinga, São José, Tabuleiro Alto e Vila do Rato.
                O clima é do tipo semi-árido e a temperatura chega, em média, a 31 graus centígrados. As mais altas temperaturas se verificam nos meses de dezembro a fevereiro e as mais baixas no período de maio a agosto, ficando em torno de 26 graus. Apresenta precipitação pluviométrica média anual de 600,00mm e umidade relativa do ar média anual de 69%.
                Após conhecermos essas características do clima, sabemos que o bioma da caatinga é o predominante no município. A caatinga por ser vegetação típica da região do semi-árido, constituída por árvores e arbustos espinhentos ou xerófilas (que na denominação indígena significa "mato branco ou esbranquiçado ou mesmo ralo"), em sua maioria, com elevação de variável altitude, suporta o calor e floresce na época das chuvas.
                As árvores encontradas em maior quantidade na região são: Umburanas (Torresca cearensis); Faveleira (Jatrapha phyllarcontha); Jurema (Mimosa sp); Marmeleiro (Combretum sp); Carnaúba (Copernícea cerífera).
                A agricultura de subsistência (milho, feijão, batata-doce, jerimum, etc.) foi predominante no município, aliada à pecuária de corte e de leite. Deve-se considerar a atividade pesqueira que, dados os mananciais de água acumulada em lagoas no município e adjacências, sempre constituiu riquíssimo potencial para manutenção dos habitantes que utilizavam ainda esses aqüíferos sem limites de exploração, desde que é patrimônio público.
                Com a chegada da PETROBRAS, na década de 80, do século XX, o município viu outras potencialidades e seus habitantes passaram a conviver com maquinarias que transportavam o desenvolvimento e aproximavam a região de outras perspectivas de futuro. As empresas prestadoras de serviço à PETROBRAS investiram alto e o município passou a ter mais emprego, maior capacidade de aquisição e, não apenas o município, mas os proprietários passaram a participar de royalties da produção do petróleo que produzissem as suas áreas.
                O município, a partir daí com orçamento mais generoso, ampliou seus investimentos em educação, saúde, comunicação, e os empreendedores criaram coragem e investiram em bares, restaurantes, pousadas, transportes locomotivos e a convivência com pessoas de outras regiões proporcionou a troca de conhecimentos e de cultura. Só que o desenvolvimento econômico não se desliga do social e a chegada de pessoas, não apenas das proximidades, mas de outros estados brasileiros e internacionais, rendeu ao município o rótulo de "paraíso do petróleo e da prostituição infantil", dada a invasão de "estrangeiros" sem fronteiras que assanharam a juventude de comunidades até então sem muito brilho, mas racionalmente comprometidas com a honradez e com a instituição familiar. Como prêmio de consolação, aceitou-se a filosofia popular que diz: "Para fazer o omelete é necessário que se quebrem os ovos".
                Desse marasmo em que vivia até então, com o comportamento de cidade pequena do interior, sem maiores ambições ou perspectivas, de repente, o Alto do Rodrigues passou a conviver com máquinas pesadas, com perfuratrizes, cavalos mecânicos, oleodutos, numa transição violenta que não deu tempo de se preparar a população para um encontro mais harmonioso com o futuro que chegava sem ninguém esperar. E o município abraçou, não mais a idéia, mas o convício com empresas nacionais e internacionais, abrigando uma população flutuante, e tendo que aceitar e assimilar outros hábitos, outra cultura, outros processos de civilização e novos parâmetros de comportamento social e econômico trazidos pela PETROBRAS que hoje mostra perspectivas de evolução com a TERMOAÇU, BIODIESEL, GÁS NATURAL, e uma infinidade de produtos derivados do petróleo abundante em nosso subsolo.


DESENVOLVIMENTO E NOVAS PAISAGENS

Daline Maria de Souza

                ALTO DO RODRIGUES, uma das cidades do Vale do Açu, no Rio Grande do Norte, vem se destacando, nos últimos vinte anos, no cenário econômico estadual e regional pelo processo de desenvolvimento vivenciado nesse período. Simbolicamente esse processo constitui um dos mais fortes referenciais da cidade, sendo valorizado no imaginário social local ancorando novas identidades informadas pela noção de desenvolvimento que constitui a partir da idéia da cidade como um município do progresso "futuroso" e desenvolvido.
                A pesquisa "O curso da cidade e a vida do rio: as mudanças sócio-econômicas do rio Piranhas na percepção dos moradores de Alto do Rodrigues-RN", apoiada pela Base de Pesquisa Poder Local, Cultura Política e Questão Social do PPGSS/UFRN, propõe-se realizar uma análise sobre a percepção dos moradores de Alto do Rodrigues quanto às mudanças sócio-ambientais do rio Piranhas provocados pelo processo de desenvolvimento do município a partir da década de 80.
                A partir do resgate da memória dos moradores da cidade de Alto do Rodrigues, os agricultores, pescadores, canoeiros, lavadeiras, banhistas e barraqueiros do rio Piranhas em relação ao tempo anterior a esse processo, procurar-se-á avaliar as novas atribuições de sentido dadas ao lugar que o rio Piranhas ocupa historicamente na organização da vida da cidade e construir um quadro narrativo acerca do desenvolvimento.

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Daline Maria de Souza, Mestre em Ciências sociais pela UFRN, atual supervisora do projeto DESPERTAR, que funciona em Alto do Rodrigues.

                Antes da década de 80, a agricultura, a pesca, a criação de gado realizadas às margens do rio Piranhas constituíam as principais atividades do cenário produtivo do município. A partir da década de 80, com a construção da Barragem Armando Ribeiro Gonçalves e a atuação da PETROBRAS, o município passa a vivenciar, através da exploração do petróleo e da agroindústria, a dinâmica do modelo de desenvolvimento predominante no RN pós-oitenta, baseado no crescimento econômico e na industrialização. A exploração petrolífera e a agroindústria foram incorporadas ao cenário produtivo da cidade representando no que diz respeito ao rio Piranhas a captação de suas águas para irrigação dos projetos agroindustriais em sua maioria localizados em suas margens, e a estruturação de estradas e pontes que atravessam o rio, possibilitando o acesso às jazidas de petróleo. Essas mudanças no cenário produtivo da cidade têm redesenhado a paisagem do rio Piranhas.
                Além disso, ocorreram mudanças nas práticas sociais dos indivíduos que atribuem ao rio Piranhas um significado diferente do produtivo. De espaço de lazer e recreação de práticas de atividades esportivas em suas margens, de sua utilização lúdica nos fins de semana e feriados, o rio passou a ser um espaço redesenhado, de um pequeno comércio de ambulantes e barracas "bar e restaurante" localizados em suas margens, atraindo um público local e de outras cidades, que se beneficia da estrutura de estradas e pontes construídas pela parceria entre Prefeitura Municipal e a empresa PETROBRAS.
                É importante observar também que o crescimento da exploração petrolífera e da agroindústria nas duas últimas décadas do século XX representou modificações na formação ambiental do rio Piranhas, tais como a diminuição da pesca, a queda do nível da água e um processo de modificação que tem ocorrido nas suas proximidades, sinalizando para o perfil de inadequação ambiental do modelo de desenvolvimento vigente no município de Alto do Rodrigues.
                Na percepção dos moradores, os aspectos positivos do desenvolvimento centram-se no fato de que este contribuiu para a ampliação dos serviços públicos municipais, do comércio local e para a urbanização da cidade. Ao mesmo tempo, valorizavam negativamente o desenvolvimento, pelas mudanças sócio-ambientais provocadas no rio Piranhas.
                A nova paisagem do rio Piranhas traduz as mudanças da dinâmica do desenvolvimento em suas dimensões sócio-espacial e Ambiental. Essas mudanças fornecem os suportes de um imaginário social constituído a respeito do desenvolvimento e das modificações ocorridas com a vida do rio. Esse imaginário social institui os significados que os diversos segmentos sociais da cidade atribuem às novas práticas sociais e ao novo cenário ambiental resultantes do processo de desenvolvimento de Alto do Rodrigues.